terça-feira, 20 de junho de 2023

Curso sobre o pensamento de Marx

CURSO O PENSAMENTO DE KARL MARX:

Inscrições até o dia 22/06. 

Início do curso dia 24/06. 

Todas as informações estão no cartaz.




quarta-feira, 1 de abril de 2020

3a Edição do Manifesto Autogestionário - Nildo Viana

Capa da 3a edição do Manifesto Autogestionário:
VIANA, Nildo. Manifesto Autogestionário. 3a Edição, Rio de Janeiro: Rizoma, 2018.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

O contéudo econômico do socialismo em Lênin é o mesmo que em Marx?

Abaixo artigo que compara a concepção de socialismo em Marx e Lênin, escrita pelo sociólogo indiano, residente nos Estados Unidos, Paresh Chattopadhyay, "O contéudo econômico do socialismo em Lênin é o mesmo que em Marx?", publicado originalmente na Revista Enfrentamento, do Movaut - Movimento Autogestionário.








domingo, 8 de janeiro de 2017

Número 05 da revista Marxismo e autogestão é publicada!


v. 3, n. 5 (2016)

Revista Marxismo e Autogestão 05

Revista Marxismo e Autogestão, vol. 03, num. 05, jan./jun. de 2016.

Sumário

Editorial

Pessimismo e Otimismo Texto Completo
Conselho Editorial 3-4

Marxismo Autogestionário

A Concepção Marxista de Classes Sociais Texto Completo
Nildo Viana 5-20
Marx e Bakunin Texto Completo
Maurício Tragtenberg 21-42

Marx, Marxismo e Marxistas

Karl Korsch: Breve Biografia Intelectual Texto Completo
Paul Mattick 43-60
Marx e a Ideologia Alemã Texto Completo
Otto Rühle 61-66

Análise e Crítica Marxista

O Homem e a Liberdade Texto Completo
Gajo Petrovic 67-73
Reflexões sobre a Utopia e a Revolução Texto Completo
Maximilien Rubel 74-81

Capitalismo e Luta de Classes

O Mundo Vivido e a Impotência da Consciência Texto Completo
Roy Panik 82-88
O Novo Movimento Revolucionário Mundial Texto Completo
Nicos Zagorakis 89-96

Teorias da Autogestão

A Autogestão como Conteúdo do Novo Ciclo Revolucionário Texto Completo
Nildo Viana 97-99

Experiências Autogestionárias

A Revolução Francesa de Maio de 1968 Texto Completo
Alan Woods 100-120

Autogestão e Formação

Autodidatismo e Educação Escolar Texto Completo
Leon Rodriguez 121-127

Escritos Atuais do Passado

A Destruição como Método de Luta Texto Completo
Anton Pannekoek 128-130
Mercado e Crise Texto Completo
Karl Marx 131-133

Polêmicas e Outras Perspectivas

Notas Sobre Trotsky, Pannekoek e Bordiga Texto Completo
Jean Barrot 134-143

Resenhas

Keith Jenkins: Historiografia e Poder Texto Completo
Nildo Viana 144-155

sábado, 6 de agosto de 2016

Manifesto Autogestionário: um plágio criativo do Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels

Resenha: VIANA, Nildo. Manifesto Autogestionário. Rio de Janeiro: Achiamé, 2008 

Manifesto Autogestionário: um plágio criativo do Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels

Lucas Maia Dos Santos∗ 

160 anos separam o Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels do Manifesto Autogestionário de Nildo Viana. O manifesto dos autores alemães é sem sombra de dúvidas um pequeno texto que vale por obras inteiras. O texto de Nildo Viana é um plágio do velho manifesto ou como o autor mesmo diz: “é um plágio de um plágio”, pois Marx e Engels são acusados de plagiarem o Manifesto da Democracia de Victor Considerant. Marx e Engels teriam plagiado Considerant? Nildo Viana afirma peremptoriamente que não, pois embora haja algumas semelhanças formais em ambos os textos, as teses defendidas no Manifesto do Partido Comunista não se encontram no Manifesto da Democracia. 

Os prefácios feitos por Marx e Engels às sucessivas edições do Manifesto do Partido Comunista demonstram uma preocupação dos autores em ressaltar que as teses ali expostas não são um catecismo que deva ser seguido ad eternum. O revolucionário que de fato queira compreender o processo histórico e de alguma maneira contribuir com a transformação social, deve cotidianamente preocupar-se em analisar concretamente as condições históricas dadas. Não basta apreender um conjunto de postulados e aplicá-los indefinidamente em qualquer situação e contexto histórico. Não há nada mais idealista que tal procedimento. 

O Manifesto da Liga dos Comunistas de 1848 é a expressão mais clara de uma nova concepção da história, que considera os processos reais analisados de uma maneira concreta, ou seja, que ambiciona encontrar as múltiplas determinações que explicam a realidade. Marx e Engels demonstraram que a alavanca da história é a luta de classes. A luta entre senhores de escravos e escravos no modo de produção escravista da antiguidade, a luta secular entre senhores feudais e servos no modo de produção feudal e por último, a dramática guerra civil, ora oculta ora declarada, entre burgueses e proletários trouxeram a humanidade aos nossos dias. 

O que o Manifesto do Partido Comunista representa é justamente um programa prático que expressa uma concepção revolucionária. Neste texto está contido a concepção do desenvolvimento histórico entendida de um ponto de vista materialista, a relação dos comunistas com a classe operária e a posição dos comunistas diante das demais tendências oposicionistas e da literatura socialista existente até aquele período. Para demonstrar como entendem o processo histórico, afirmam: “A história de toda sociedade até nossos dias tem sido a história das lutas de classes”. Isto coloca o proletariado na pauta das discussões, pois sendo ele produto genuíno desta sociedade, a ele também cabe o papel histórico de abolição das relações sociais existentes. É com base nisto que afirmam que o papel dos comunistas não é o de dirigir a classe operária rumo à revolução, pois segundo entendem, os comunistas não ∗ Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Goiás e professor da rede municipal de ensino de Goiânia. são um partido a parte, separado da classe operária, são simplesmente a fração mais resoluta do proletariado. Apresentam em relação a este a vantagem de terem consciência dos fins da luta ao passo que os proletários em geral só adquirem consciência destes fins durante o processo de luta e principalmente nos momentos mais radicais desta verdadeira guerra civil – a luta de classes. É por esta razão que terminam o texto com a célebre frase: “Proletários de todo o mundo, uni-vos”! 

Se em linhas gerais, o Manifesto de 1848 continua atualíssimo, pois a sociedade capitalista ainda merece ser destruída, pois o proletariado ainda é o verdadeiro sujeito da revolução, pois os comunistas continuam a existir etc., não é menos verdade que a sociedade transformou-se consideravelmente de lá para cá. Sendo, portanto, coerente com os princípios do materialismo histórico, nada mais adequado do que realizar uma atualização deste manifesto. 

O materialismo histórico-dialético é um método vivo, posto que expressão concreta do movimento do mundo. Aplicando-o ao estudo de realidades concretas, produzimos interpretações teóricas destas realidades. Uma teoria é um conjunto de conceitos e categorias articulados num processo coerente de explicação da realidade. A teoria visa explicar. Sendo expressão explicativa do mundo, ela ajuda a contribuir com o processo de transformação e também permite clarear melhor as nuances do processo revolucionário, sendo importante arma no combate à contra-revolução (seja ela burocrática ou burguesa). Esta teoria deve ser constantemente submetida à análise e reanálise, deve estar sempre com os olhos voltados para o mundo, deve sempre explicá-lo. Se assim não o for, torna-se ideologia, ou seja, uma visão invertida da realidade, uma falsa consciência. 

O marxismo, de teoria revolucionária, tornou-se durante o século 20 um conjunto de ideologias tão díspares e ao mesmo tempo tão distantes do marxismo que a utilização deste termo para qualificá-lo enquanto tal ficou bastante problemática. Foi o que o que ocorreu com a social democracia, com o leninismo e todas as suas variações (stalinismo, trotskismo, maoísmo etc.), com a fusão do “marxismo” com ideologias científicas (estruturalismo, fenomenologia etc.) dentre outras possibilidades de deformação. Por isto, a teoria revolucionária, ou seja, o marxismo, deve explicar o mundo e por causa disto deve ser a crítica radical de toda e qualquer ideologia já existente ou que venha a ser produzida. 

Por isto, Nildo Viana se coloca nesta difícil e ao mesmo tempo instigante tarefa de “atualizar” o Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels. O desafio já começa com a preocupação terminológica. O termo comunismo se prestou a tantas barbáries e tantas confusões na longa história das lutas operárias do século 20 que de um conceito que visava e expressava o processo revolucionário, tornou-se um grande monstro que justificava as mais gigantescas burocracias (União Soviética, China, Cuba etc.). Tornou-se um conceito que estava articulado a uma ideologia que utilizava uma fraseologia “marxista”, mas que na verdade era somente uma forma de dominação da burocracia. A disseminação da idéia de comunismo como vinculada aos partidos bolcheviques presta-se à edificação de grandes confusões: onde antes tinha-se revolução, agora tem-se contra-revolução burocrática, onde antes tinha-se um “sonhar para frente”, para utilizar expressão de Ernst Bloch, agora tem-se um eterno retorno das sombras do passado. Assim, o Manifesto do Partido Comunista torna-se no seu plágio contemporâneo o Manifesto Autogestionário. Mata-se dois coelhos com uma cajadada só: abandona-se o uso da confusa expressão “comunismo” e da palavra “partido”. Embora Marx e Engels desse um sentido diferente à palavra partido, ou seja, aqueles que tomam partido, que tomam parte, que se posicionam como comunistas, com o desenvolvimento das burocracias partidárias e da “democracia burguesa” torna-se um termo que presta-se à confusão e não à explicação. 

Formalmente, o Manifesto Autogestionário segue a mesma lógica do Manifesto do Partido Comunista. Apresenta, na seção 1, a luta entre burgueses e proletários, denominando-a de “A burguesia e o proletariado: a dinâmica da luta entre trabalho morto e trabalho vivo”. Esta é a parte mais difícil de ser atualizada, pois trata da essência do modo de produção capitalista. Por esta razão, as modificações que sofreu são mais formais e conjunturais. A preocupação centra-se então em precisão terminológica. A burguesia, fulcro dominante da exploração capitalista representa o trabalho morto, fruto da exploração, merecendo, portanto, ser sumariamente abolida enquanto classe. O proletariado, por sua vez é o trabalho vivo, o centro da criação e da criatividade. Por este motivo, a ele cabe a difícil tarefa de destruir o capitalismo e construir a autogestão social. 

Na seção 2, “A autogestão das lutas operárias”, é apresentada a pré-condição sem a qual qualquer revolução proletária torna-se impossível: a autogestão das lutas. O que precisamente significa isto? Nada mais nada menos que “a emancipação dos trabalhadores é obra dos próprios trabalhadores” como disse Marx na introdução aos estatutos da Associação Internacional dos Trabalhadores, a primeira Internacional. No período em que o Manifesto do Partido Comunista foi redigido, a luta proletária era ainda inaugural, na Alemanha e em alguns países, a burguesia ainda lutava contra os senhores feudais, o proletariado ainda não tinha as ferramentas necessárias para derrubar a burguesia como um todo, mas mesmo assim, as jornadas de fevereiro de 1848 assustaram a classe burguesa que se consolidava. 23 anos depois, no ano de 1871, em Paris, o proletariado mostra sua verdadeira face à burguesia e a classe dominante treme diante daquela insurreição. A Comuna de Paris, como a primeira experiência histórica do proletariado enquanto classe para si, ou seja, que expressa seus interesses de classe, levam Marx e Engels a fazer uma pequena “correção” em seu Manifesto. No prefácio de 1872, afirmam que o proletariado não pode direcionar suas lutas para a conquista do poder de estado, como haviam afirmado em 1848, mas sim que deve aboli-lo imediatamente com a intenção de criar o autogoverno dos produtores. A Comuna de Paris seria a forma finalmente encontrada de uma associação verdadeiramente livre de produtores. 

Várias outras experiências se sucederam após a Comuna: as revoluções russas de 1905 e 1917, as tentativas de revolução na Alemanha, Itália, Hungria etc. no período de 1918 a 1923, a tentativa de revolução na Hungria e França em 1956, o maio de 1968 francês, as greves selvagens na Europa na década de 1970, a formação de Conselhos operários na Polônia em 1980 etc. Mais recentemente, algumas experiências limitadas na Argentina em 2001 com a criação das assembléias de bairros e o movimento piquetero, a experiência de Oaxaca no México etc. demonstram que as lutas operárias não acabaram, mas que pelo contrário, expandiram-se para o mundo inteiro, posto que o capitalismo estende hoje seus tentáculos a todos os lugares. 

Além destas experiências históricas aqui citadas e inúmeras outras que não foram destacadas, alia-se toda a produção cultural ligadas a elas. Destaco o Comunismo de Conselhos desenvolvido por entre outros: Karl Korsch, Otho Rhüle, Anton Pannekoek, Herman Gorter, etc. O Comunismo de Conselhos, que se consolida na segunda metade da década de 1920 é a expressão teórica mais desenvolvida da classe operária até então. Desenvolveu até as últimas conseqüências a idéia de classe operária para si, vendo nos conselhos operários a forma e o princípio geral de organização das lutas operárias na sociedade capitalista bem como a forma e o princípio de auto-organização da sociedade futura. 

É com base nestas experiências históricas e, entre outras concepções, mas principalmente o Comunismo de Conselhos, que Nildo Viana coloca no primeiro plano a necessidade de autogestão das lutas operárias, pois é através delas que se criam as condições materiais de se abolir as organizações burocráticas: partidos (todos), sindicatos (todos), estado (todos). Além disso, os conselhos operários são a organização necessária para auto-educação do proletariado, tanto no seu processo de luta contra a burguesia e a burocracia, mas principalmente na sua maior tarefa, ou seja, reorganizar e gerir a futura sociedade. 

A seção 3, “As tarefas dos militantes autogestionários – estratégia revolucionária”, é exclusivamente dedicada ao papel dos militantes revolucionários. Os grupos e os militantes revolucionários não são a “vanguarda” da classe operária. Aos grupos revolucionários não compete dirigir a classe, determinar os rumos e os ritmos das atividades da classe. Também não é uma ação revolucionária ficar nos limites das lutas reivindicativas do proletariado. Assim, uma grande contribuição dos militantes é a luta cultural, ou seja, produção de uma interpretação teórica profunda da realidade, crítica implacável de toda e qualquer ideologia, ou seja, tudo aquilo que contribua com o avanço da consciência revolucionária. 

A única estratégia verdadeiramente revolucionária dos militantes autogestionários é contribuir com a auto-emancipação do proletariado: “O papel dos militantes autogestionários é, envolvidos na dinâmica da luta operária, acelerar o processo revolucionário e reforçar as condições necessárias para a vitória do proletariado. É necessário desencadear uma intensa luta cultural e política com o objetivo de jogar as massas na luta direta pela sua emancipação e criar a ação revolucionária das classes exploradas” (Viana, 2008, p. 35). Assim, ao militante não cabe ficar sentado no sofá da sala assistindo TV, como também não é revolucionário ser “vanguarda”, da mesma forma que é contra-revolucionário ficar no nível das lutas espontâneas e autônomas. A única estratégia revolucionária é articular os fins da luta (a autogestão social) com os meios (a autogestão das lutas). Esta estratégia visa avançar sempre a luta dos estágios espontâneo e autônomo para uma luta autogestionária, o terceiro e o mais radical estágio da luta operária. 

Na seção 4, “Posição diante das demais tendências oposicionistas”, faz uma crítica às concepções ditas de esquerda. Define como tendência oposicionista os grupos e indivíduos que se opõem ao capitalismo ou a governos estabelecidos tanto no plano teórico quanto prático. Cada uma das tendências tem uma base social definida: intelligentsia, burocracia, jovens estudantes etc. podendo ter em uma tendência mais de uma destas. Critica-se o pseudomarxismo acadêmico, o pseudomarxismo reformista, o pseudomarxismo bolchevista, o sindicalismo, o “socialismo” individualista, o “socialismo” filosófico, o “socialismo” romântico e o anarquismo dogmático. Com relação ao anarquismo, é necessário destacar que existe o anarquismo revolucionário. Esta, contrariamente às suas variantes dogmáticas, aponta para uma perspectiva verdadeiramente revolucionária. É uma doutrina com princípios revolucionários, mas sem uma teoria da história e do capitalismo. Alguns anarquistas assumem por isto a interpretação marxista do capitalismo e da história, ou seja, o materialismo histórico-dialético. 

A posição dos militantes autogestionários diante das tendências oposicionistas é variável. Com relação às tendências academicistas, sindicalistas, reformistas e bolchevistas, a relação deve ser de crítica, excetuando em casos raros e em conjunturas específicas nas quais seja possível “uma ação conjunta por questões pontuais”. Com relação às individualistas, românticas, filosóficas e dogmáticas, a relação deve ser de debate franco com o intuito de demonstrar as conseqüências das posições e práticas destas concepções. Com relação ao anarquismo revolucionário, a relação deve ser de ação conjunta e ajuda mútua. É necessário que se diga que estamos falando de concepções e não de indivíduos ou organizações específicas. Um indivíduo pode aderir a uma concepção leninista, por exemplo, mas isto não o impede de em determinado contexto histórico mudar de posição. A falta de consciência da existência de determinadas concepções mais radicais faz com que alguns indivíduos façam a adesão a concepções reformistas ou ingênuas. Neste caso, a possibilidade de avançar para concepções mais radicais é mais factível. Entretanto, em alguns indivíduos isto já é mais problemático, pois a estrutura de personalidade de algumas pessoas que ao entrar numa dada organização burocrática vêem nela a maneira necessária, pois isto reflete a sua própria mentalidade burguesa e burocrática. Isto torna mais difícil sua mudança de concepção, pois reflete seus valores, sentimentos, enfim, o conjunto de sua mentalidade. A crítica deve ser direcionada às concepções e não a indivíduos considerados isoladamente. É claro que determinados indivíduos de organizações burocráticas, principalmente seus chefes, dificilmente mudarão de concepção. Neste caso, o combate deve ser franco e direto. 

Encerra-se o manifesto com a seção 5, “A sociedade autogerida”. Nesta última parte, Nildo Viana faz uma belíssima análise utópica. A utopia, no sentido em que Ernst Bloch no seu livro O princípio Esperança emprega o termo, trata-se de uma visualização da tendência, manifestando uma consciência antecipadora. Utopia, nestes temos, não é considerada como sendo uma imagem ilusória de um lugar que não existe. Esta é uma utopia abstrata. Para Bloch, a utopia deve ser concreta, ou seja, deve ser a visualização do futuro (consciência antecipadora), mas considerando os processos de tendência. Trata-se na verdade do rompimento com o saber meramente empírico; com esta cisão, a esperança entra como categoria analítica da realidade presente. A história até Marx considerou somente o passado. A partir do materialismo histórico-dialético, o futuro, a utopia concreta entra em cena na leitura do mundo. Deste modo, as antevisões da sociedade do futuro, a sociedade autogerida, não são abstrações sustentadas em castelos de carta, são na verdade a fuga do pensamento para o futuro, a colocação da realidade no front entre o hoje e o amanhã, sendo este a expressão de uma tendência profunda existente nesta sociedade. 

A análise que o autor faz da sociedade autogerida é realizada a partir da observação das experiências revolucionárias existentes até então e nas interpretações teóricas sobre estas experiências. O modo de produção capitalista tem como sua essência a produção de maisvalia. É a partir dela e para sua reprodução que tudo o mais se estrutura: mercado, estado, dinheiro, individualismo, burocracia, burguesia-proletariado etc. A essência do modo de produção comunista, pelo contrário, é a autogestão social. A partir da generalização da autogestão através dos conselhos operários, que na sociedade autogerida deverá mudar de nome, visto que não mais existirão operários, mas somente produtores livremente associados, tudo o mais será re-estruturado. O estado, o mercado, o dinheiro e as classes sociais sucumbirão. Um novo ser humano será construído, uma nova mentalidade, uma nova sociabilidade, uma nova forma de associação entre as pessoas se erguerá. 

O Manifesto Autogestionário é, portanto, uma leitura indispensável para os militantes revolucionários hoje. Quem quiser ter acesso a uma obra de indiscutível radicalidade, de nomeada coerência e inteira correspondência com o processo revolucionário deve ler este manifesto. E, a partir daí, como provoca o autor, cada um deve se sentir tentado a escrever seu próprio manifesto, pois isto é coerente com marxismo revolucionário, libertário. No final das contas, este pequeno plágio é uma das obras mais originais dos últimos tempos.

TEXTO PUBLICADO ORIGINALMENTE EM:
http://www.espacoacademico.com.br/092/92res_santos.pdf

sexta-feira, 18 de março de 2016

Ascensão e Queda dos Partido dos "Trabalhadores"



Ascensão e Queda do PT

Nildo Viana



 O PT – Partido dos Trabalhadores, nasceu num processo de avanço das lutas sociais no Brasil. A luta operária que gerou no ABC paulista os conselhos de fábrica no bojo de um forte movimento grevista foi fundamental nesse processo. Nesse momento, a Igreja com as entidades de base, outros setores da sociedade, se mobilizaram. Não havia homogeneidade, mas havia um objetivo perseguido pela ampla maioria: democracia. O PT emerge do novo sindicalismo e desse processo, aglutinando também um conjunto de intelectuais e grupos políticos de esquerda. A hegemonia interna, no entanto, era da ala moderada, que tinha no operário Lula o grande suporte popular. Apesar da hegemonia da ala moderada, intelectuais e grupos mais à esquerda, bem como uma militância com um número expressivo de trabalhadores das classes desprivilegiadas, fizeram o PT ter um discurso mais à esquerda.

A evolução do PT mostrou o que já havia acontecido na social-democracia europeia e em todos os países do mundo. Os partidos, supostamente “operários” ou “social-democratas”, são, no fundo, organizações burocráticas que criam interesses próprios (1). Eles começam como pequenas burocracias e discurso mais radical e tão logo a máquina partidária vai crescendo, os mais radicais vão saindo, ou sendo expulsos (2), novos membros, geralmente oportunistas querendo entrar para a política institucional, vão entrando. As vitórias eleitorais significam mais cargos, mais interesses, menos radicalidade. O PT foi crescendo e se tornando cada vez mais conservador. Esse processo foi se aprofundando com o passar dos anos e eleições, até chegar ao momento de ascensão ao poder, as eleições de 2002. Foi nesse ano que o PT resolveu ganhar as eleições a qualquer custo e, obviamente, todos sabiam que o custo seria moderar mais ainda o discurso, buscar apoio de setores do capital e conquistar a confiança abandonando qualquer resquício de posição política à esquerda. O PT fez tudo para tranquilizar o capital nacional e internacional e conseguir o apoio necessário. O tradicional vice-presidente do PC do B (Partido Comunista do Brasil) foi substituído por José Alencar, do PL – Partido Liberal, um capitalista do setor têxtil. A aliança partidária passou a ser mais variada e com setores mais conservadores. E cabe destaque, no conjunto de alianças estabelecidas, a realizada com a Rede Globo (3), s
ua antiga inimiga e uma das responsáveis por sua derrota em 1989. Uma nova imagem do PT e dos seus integrantes vai sendo formado, visando ganhar a confiança da classe dominante e do bloco dominante, conquistando apoio até do capital comunicacional, estratégico para a vitória eleitoral. Quem vende a alma recebe o que quer,
mas fica em dívida com o comprador. O PT, tal como afirma Lula, não queria esperar 30 anos para chegar ao poder (4). O apoio de Sarney e, posteriormente, de Maluf e outros mostravam que a burguesia poderia confiar tranquilamente em Lula. A estratégia do PT era se incluir no bloco dominante, pois somente assim teria chances eleitorais reais.

O Governo Lula assume uma posição neoliberal, tal como exigida pelas necessidades do capital, com feição populista, tal como seus programas sociais, inicialmente o Fome Zero e os posteriores. O neoliberalismo neopopulista, que tinha alguns pilares, como garantir a estabilidade financeira e política (a política financeira seguiu esse caminho), cortar gastos, entre outros, foi seguida ao lado de alguns gastos sociais, mínimos, nas políticas voltadas para o lumpemproletariado (no sentido amplo do termo, incluindo todos que estão no desemprego e subemprego), ao lado de políticas sociais paliativas e políticas segmentares (visando certos segmentos sociais, embora somente atingisse os seus estratos superiores, como negros, mulheres, etc.), cooptação de movimentos sociais, aumento relativo do consumo, manipulação das estatísticas (que apontavam diminuição da pobreza, aumento da “classe média”, etc.). Nesse contexto, mantendo o apoio do capital comunicacional e com a acumulação de capital em ascensão, tais políticas conseguiram um amplo apoio. Os setores mais radicais do PT e da sociedade não conseguiam maior espaço e a maioria acreditava no discurso evolucionista de que os passos seguintes apontariam para reformas mais profundas. Nesse momento, nem o discurso social-democrata e suas reformas estruturais apareciam mais. O PT se tornou ainda mais conservador e se tornou governo, estando alegremente ao lado de Sarney, Collor e Maluf, grande parte do capital, especialmente o comunicacional, com destaque para as Organizações Globo. As chamadas conquistas do Governo Lula foram possível por ser um período de estabilização da acumulação de capital, que só se estabiliza com a reprodução ampliada do capital, o chamado “crescimento econômico” e qualquer governo no lugar realizaria o mesmo, no que se refere ao consumo, a diferença seria que nem todos fariam a política neopopulista de cooptação e políticas segmentares.

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Apesar de alguns percalços, o Governo Lula conseguiu, nesse período, manter o governo e a estabilidade e ainda garantir um terceiro mandato para o seu partido, através de Dilma Roussef. O Governo Dilma não teve a mesma sorte, apesar de no início não ter encontrado grandes problemas, até que um novo contexto emergiu. Por um lado, a crise financeira de 2008 e os primeiros momentos de desestabilização do regime de acumulação integral (5), começam a se fazer sentir alguns anos depois no Brasil, bem como graças à dinâmica interna do capitalismo brasileiro. O desgaste do Governo Dilma ocorreu de forma mais visível a partir das manifestações de 2013, que começou com as manifestações estudantis de maio, que se transformaram em manifestações populares em junho. O Governo Dilma prometeu muito para arrefecer os ânimos dos manifestantes, mas tão logo elas diminuíram, tudo voltou a ser como antes. As ações governamentais diante das pequenas manifestações posteriores contra a Copa do Mundo, marcadas por uma intensa repressão policial, mostraram uma face a mais do governo, que com isso perdeu apoio e voto em setores da juventude, dos trabalhadores e de certos grupos políticos, somando aos que já possuíam essa posição anteriormente.

As eleições de 2014 mostraram o enfraquecimento de Dilma Roussef, que perdeu votos que foram para, por um lado, os demais partidos concorrentes (e, no segundo turno, para o candidato do PSDB – Partido da Social-Democracia Brasileira), por outro, para as abstenções, votos nulos e brancos, que, somados, significaram quase um terço do eleitorado.

No contexto das eleições, a situação financeira do país encontrava problemas crescentes e seriam necessárias algumas medidas impopulares, coisa que a presidente e candidata não quis fazer. O aumento da dívida pública e déficit primário ocorrem no primeiro semestre de 2014 (6).
Isso geraria mais problemas adiante de qualquer forma, mas sem agir nesse momento, as consequências seriam mais fortes, o que era previsível. Isso provocou a necessidade de medidas urgentes por parte do governo, num contexto de ano eleitoral e com a presidente sendo candidata à reeleição (7), motivo pelo qual isso não ocorreu. Dilma encerrou seu primeiro mandato numa situação diferente dos dois anteriores de Lula, em época de dificuldades na acumulação de
capital (“crescimento econômico”), além dos limites do governo em matéria de competência e mudança, pois em 2015 poderia ter tomado medidas para minimizar o impacto das mudanças e quase nada foi feito, em parte por questões políticas, em parte por incompetência.

A grande questão é que o PT, por suas origens, por resquícios de discurso de “esquerda”, e por causa de seus compromissos eleitorais (que implica em gastos e evitar determinadas ações necessárias), ao lado de sua inércia em política financeira e resolução dos problemas que emergiram e foram se avolumando, acabou tendo problemas em seu romance com o capital. Já nas eleições de 2014, o capital, reforçado pelo temor das manifestações de 2013 (e o discurso de Dilma e medo de uma adoção de políticas mais desfavoráveis para os seus interesses), já tinha vários setores que se deslocaram para outro apoio eleitoral, muitos com ambiguidades (alguns setores do capital apoiaram financeiramente as duas candidaturas principais, afinal de contas, assim ficariam do lado do governo, independente de quem ganhar). O capital comunicacional também começa a se deslocar e a aliança PT-Globo é desfeita.

Esse processo foi marcado por um ano de 2015 muito ruim para o Governo Dilma e PT. A crise financeira vai paulatinamente se aprofundando e o imobilismo do governo mostra isso. As greves aumentam e algumas manifestações começam a ressurgir. A repressão e as ações governamentais que apontam para precarização da educação e outros setores, gera novo descontentamento. O governo Dilma e seus aliados, a ala governista do bloco dominante, começa a perder apoio. Setores do capital, a maior parte do capital comunicacional, adotam posição cada vez mais contra o governo. As denúncias de corrupção vão tomando corpo, gerando impopularidade e servindo de pretexto para a ala oposicionista do bloco dominante atacar a ala governista. A palavra impeachment vai sendo cada vez mais proferida. O PT e o Governo Dilma perdem espaço e apoio progressivamente. A burocracia estatal estatutária (que é permanente) começa a se desligar da burocracia governamental (que é provisória), o que se pode ver pela autonomização do aparato jurídico e repressivo. O aparato repressivo (polícia federal) e o aparato jurídico fecham o cerco e recebem apoio maciço do capital comunicacional.

As políticas petistas não conseguiram organizar bases permanentes de apoio. Os setores dos movimentos sociais cooptados não são uma grande força mobilizadora, e os que já eram aparelhados pelo PT também. A parte da intelectualidade que se alia à ala governista do bloco dominante, também não tem grande presença intelectual e política. O exército de descontentes aumenta, pois, por um lado, tanto o bloco revolucionário quanto grande partes das classes desprivilegiadas, rechaçam o governo petista e, por outro, setores das classes privilegiadas também mostram um grande descontentamento com o PT. Com uma base de apoio tão frágil, e com a crise financeira, os setores do capital já descontentes foram reforçados por novos setores do mesmo, bem como pelo capital comunicacional e a burocracia estatutária. O desenrolar do processo, com a crise financeira sem grande perspectiva de solução e os escândalos de corrupção, foram suficientes para que o capital repensasse sua posição diante do governo Dilma. O PT entrou no seleto grupo do bloco dominante e para isso vendeu sua alma ao capital. No entanto, não entendeu que ele era um “convidado”, oriundo do bloco progressista, e não um sócio permanente e que, por isso, poderia ser convidado a se retirar a qualquer momento. Uma vez no poder, usou e abusou do mesmo, inclusive contra as classes desprivilegiadas e bloco revolucionário, bem como aparelhou o Estado pensando pensando que isso garantiria sua permanência. Mostrou também incompetência e inoperância, junto com sua ambição de permanecer no poder acima de tudo, e isso gerou o seu isolamento no bloco dominante, facilitado por seu afastamento das classes desprivilegiadas, o que foi perceptível em 2013. A "hora da estrela" passou e agora é o momento de sua queda.

Assim, os petistas de carteirinha tem certa razão ao reclamar da Rede Globo, do aparato jurídico e repressivo e dos “exageros”. Ele deu brechas e a ala oposicionista do bloco dominante, cada vez mais forte, as usou: via oposição parlamentar e pedido de impeachment, via capital comunicacional, via mobilização da população e aparato repressivo e jurídico. Dessa forma, o Governo Dilma foi perdendo todo o respaldo (8).
Isso tudo explica a queda do PT, que voltar a ser um mero partido do bloco progressista (e aí vai mudar um pouco o discurso, com tom mais progressista e menos moderado) e sai do grupo seleto do bloco dominante. O principal responsável por isso tudo é o próprio PT, por ter ficado embebido com o poder e não entender a luta de classes, sem compreender também a dinâmica da acumulação de capital e por isso achar que ficaria sempre junto com o bloco dominante. Não fez o trabalho de constituir bases mais sólidas para manter sua força diante do capital. O Partido dos “Trabalhadores” não buscou apoio das classes trabalhadoras, fazendo muito pouco por elas.

O atual discurso petista, sobre “golpe” é totalmente sem sentido. O capital está fazendo o que sempre fez e foi o PT, dentro da esquerda capitalista, o que mais insistiu na defesa da “legalidade”, do “estado de direito”, “democracia (representativa)”. Tudo que está sendo feito é dentro dessa legalidade, estado de direito e democracia representativa, e, portanto, o discurso do golpe é falacioso. Esse é o processo normal na democracia representativa e capitalismo e, portanto, essa “indignação seletiva”, para usar linguagem petista, que se manifesta apenas quando tem seus próprios interesses feridos, é a lógica do oportunismo. Afinal, o PT foi beneficiado por esse mesmo esquema, o reproduziu, não fez nada contra, se beneficiou. Os governos petistas fizeram coisas muito semelhantes (e inovaram com o aparelhamento do estado como nunca visto antes) e nas últimas eleições, a prática petista contra seus adversários é um adendo ao engodo eleitoral realizado. O que está sento feito com o Governo Dilma e PT é o que sempre se fez e sempre se fará numa sociedade capitalista.

A corrupção petista existe, não é uma invenção. Sem dúvida, outros corruptos e muita corrupção existem nos demais partidos e a corrupção é generalizada no capitalismo (9). O PT fez o jogo, mas agora os donos da bola não
querem mais ele no campeonato. Vai ser expulso. Se procurarem a defesa das classes desprivilegiadas, do bloco revolucionário, e até mesmo setores do bloco progressista, não encontrarão, a não ser no caso de alguns ingênuos que acreditam no discurso do golpe. No entanto, se o PT continuasse no governo, os problemas continuariam. A retomada da acumulação de capital continuaria travada por causa dos compromissos eleitorais do PT, o que prejudicaria a classe capitalista e, por conseguinte, atingiria outras classes, incluindo as desprivilegiadas (aumento do desemprego, etc.) e isso geraria um aprofundamento da crise e da deterioração das condições de vida da população em geral. O PT conseguiu criar uma situação absurda, na qual sua permanência no poder prejudicaria a todos e só beneficiaria ele mesmo.

Nesse quadro, só haveria a solução capitalista, o que o Governo Dilma fez apenas moderadamente quando era preciso ser mais forte e radical. Isso reforçaria o descontentamento da população e o PT não conseguiria manter seu projeto de poder (10). Entre a solução capitalista, que o governo
Dilma não efetivou, e a solução da continuidade indefinida da crise e agravamento da mesma, só haveria uma outra solução, que seria uma transformação social, a instituição de uma nova sociedade. Os iludidos pensam que a manutenção do Governo Dilma poderia resolver isso, mas apenas iria piorar a situação e se ganhasse as próximas eleições, teria que efetivar, sob forma drástica, políticas de austeridade. Já está na hora de acabar com a era da ingenuidade. Assim, tanto faz quem é o governo, e já no século 19 Marx já alertava para isso, a política está a serviço do capital. Essa disputa toda é apenas entre, por um lado, partidos querendo se manter no poder, e, por outro, os interesses mais determinantes do capital. O PT está isolado e não tem como reagir. Ele declarou a sua própria derrota e voltará à sua situação anterior.

Por isso, a ilusão petista, já denunciada há muito tempo, foi perdendo força. Uma verdadeira alternativa precisa ser construída, pois nesse jogo, as regras garantem o capital sempre como vencedor e a disputa interna do bloco dominante é apenas para definir a política mais adequada à acumulação do capital e quem estará no aparato estatal, usufruindo de seus privilégios, corrupção, etc. É hora do bloco revolucionário e classes desprivilegiadas, especialmente o proletariado, começar a agir em torno do projeto autogestionário ao invés de reproduzir as ilusões partidárias e eleitorais. 

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Leia mais:

A Insustentabilidade do Governo Dilma:

A Luta de Classes no Brasil:

A Corrupção na Sociedade Brasileira:

As Lições das Ruas (Análise das manifestações de 13 de março de 2016).
http://informecritica.blogspot.com/2016/03/as-licoes-das-ruas.html

O Governo Lula e as Ilusões Perdidas:
http://informecritica.blogspot.com.br/2015/08/o-governo-lula-ou-as-ilusoes-perdidas.html

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